sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Saudade consumida

Quando o filósofo Jean Baudrillard diz que vivemos o tempo dos objetos, ele fala da era do descarte, de um tempo, nas palavras do autor, “que vemos os objetos nascerem e morrerem”. E isso é fato, se antes os objetos duravam anos e anos, muitos passavam por gerações, hoje o “apego material” é menor, até porque a durabilidade dos bens também foi sendo reduzida, entre outras coisas, para funcionar como uma das justificativas dessa troca permanente.

E todos esses objetos consumidos de uns tempos pra cá foram caindo no esquecimento, assim que um outro modelo mais moderno entrava na moda. Porém, esse descarte não era puro e simplesmente do objeto em si. Junto a ele estavam muitos momentos vividos pelo indivíduo (bons, ruins, divertidos, frustrantes, enfim, momentos carregados de emoções, de valores, saudades e vontades). Talvez seja na tentativa de resgatar muito do que ficou pra trás é que a moda retrô hoje esteja em alta e o velho como sinônimo de antiquado, de coisa ultrapassada, esteja passando a ser visto e sentido por um outro ângulo, o da história, das experiências vivenciadas, como bem diz Rubem Alves (embora o autor trate de pessoas, não de objetos).

Como eu, você já deve ter recebido aqueles e-mails do tipo “matando a saudade”, que mostram brinquedos, seriados de tevê, doces, refrigerantes e tantas outras coisas que fizeram parte da infância e adolescência dos adultos de hoje. Outro dia recebi um que, entre tantas coisas, tinha um estojo de canetinhas coloridas. Aí me lembrei de quando usava daquelas para pintar meus desenhos. Gostei, pois me fez voltar ao passado.

Por outro lado, o tal e-mail também me fez pensar em outra coisa. Será que nossa história, ou o que nos faz lembrar dos bons momentos já vividos está sempre relacionado a objetos? Porque é somente isso que trazem esses e-mails, lembranças por meio de objetos. É engraçado e ao mesmo tempo triste. Será possível mudar essa realidade? Talvez e-mails que despertem as boas lembranças por meio de outros conteúdos que não sejam signos de consumismo. E os bons momentos que passamos na escola? Aquele café da tarde de domingo na casa da avó, com os primos, primas e tios? Dos bate-papos com a mãe? Das várias noites olhando o céu estrelado com amigos na tentativa sempre frustrada de ver um disco voador ou de lembrar do quanto era gostoso poder colher uma fruta no pé, na chácara do avô, e de chupá-la ali mesmo, na terra, sem a preocupação de sujar o chão? Dos doces da sogra, desde já eternizados? Enfim, de uma porção de momentos que ficaram e ficam, embora muitas vezes esquecidos nos HDs humanos sempre tão carregados dos afazeres do cotidiano.

Não que os objetos não tenham sua importância, mas a impressão que fica é que são eles os protagonistas. Tudo se resume no comprar, no ter. Estamos sempre intermediados por eles, os objetos. Até quando será assim? Precisamos tentar mudar um pouco isso, fazer com que as novas gerações tenham consciência de que o mundo não se resume num amontoado de chips e de especuladores financeiros. É preciso o resgate dos reais valores, da humanização das relações, de percebemos, como diz a jornalista Rita Trevisan, de que o mais importante são as pessoas.

crédito foto: revelando.blogspot.com