sexta-feira, 17 de dezembro de 2010
Pontos de vista
O que parece ser, pode não ser de fato, porque tudo depende do ponto de vista, de onde o observador está posicionado, tanto no sentido de localização quanto de entendimento. É interessante como muitas vezes temos uma impressão errada sobre algo que acontece sob nossos olhos.
Ter uma ideia concebida apenas de uma perspectiva pode ser perigoso. E isso se aplica tanto na vida pessoal quanto na profissional. Um ponto de vista errado pode acabar com um relacionamento, pode levar uma empresa à falência e, entrando no mercado publicitário, pode levar uma campanha ao fracasso, à perda de identidade de uma marca para com o seu público.
No livro A Arte do Planejamento: verdades, mentiras e propaganda, Jon Steel faz uma abordagem bastante rica sobre o assunto. Ele fala de três perspectivas (o que ele chama de triangulação, emprestando o termo da área de geografia, já que Steel é geógrafo de formação) que a publicidade precisa levar em consideração para o desenvolvimento das estratégias de comunicação para seus clientes. Para ele, há três pontos de observação que são fundamentais: a perspectiva comercial do cliente, a perspectiva criativa da agência e as opiniões e valores das pessoas para quem a propaganda será dirigida. Essas três pontas integradas e equilibradas darão mais condições de criar boas experiências da marca com o público. Porém, quando uma das três exerce o domínio sobre as outras, “a qualidade e a eficácia da campanha certamente estarão comprometidas”, declara Steel.
Usando uma campanha criada pela antiga agência londrina Boase Massimi Pollitt, na década de 80, para o jornal The Guardian, o autor consegue tangibilizar a importância do ângulo de observação para a construção de uma ideia. São três cenas silenciosas, exceto por uma locução simples em off, que começa assim: Cena 1 – imagem em câmera lenta mostra um skinhead mal-encarado caminhando pela calçada de um terraço sombrio, numa velha cidade industrial. No fim da rua, um carro reduz a velocidade, sugerindo uma perseguição. Uma mulher que está em pé na porta da casa entra rápido, assim que o skinhead passa correndo por ela. Então, uma voz calma, em off, diz: “Dê um ponto de vista, o acontecimento nos causa uma impressão”. Cena 2 – a mesma situação acontece sob um outro ângulo. O skinhead passa pela mulher, a imagem mostra ele correndo na direção de um senhor vestido com um longo sobretudo, um chapéu e uma maleta na mão. O homem levanta a maleta para se defender quando o skinhead avança sobre ele. Novamente, nos diz a voz em off: “De outro ponto de vista, a impressão que se tem é bem diferente”. Cena 3 – uma outra perspectiva da ação, desta vez filmada de cima de um prédio, no outro lado da rua. Desse ponto de vista, é possível ver uma grande plataforma com tijolos sendo içada na lateral de um prédio, bem em cima do senhor que porta chapéu e maleta e que está completamente distraído. A plataforma balança perigosamente. O skinhead vê tudo e sai correndo. A locução em off diz: “Mas só quando você tem a história toda é que consegue realmente entender o que está acontecendo”. Daquela perspectiva, vemos o skinhead agarrar o senhor para empurrá-lo em direção à parede, na tentativa de protegê-lo do acidente, quase no mesmo instante em que os tijolos despencam sobre a calçada. A tela escurece até ficar preta, e o nome do jornal aparece, ainda em silêncio: The Guardian. The whole Picture.
Pois bem, o problema de insistir em um determinado ponto de vista é que isso pode levar o indivíduo ao vício. E todo viciado acaba desenvolvendo uma visão distorcida, por achar que sua perspectiva representa a certeza e a verdade. E é daí que podem surgir grandes erros, pois quem não procura entender um mesmo fato por diferentes ângulos, pode ter uma visão míope e fatal. Como nos diz Steel, ser um bebedor de cervejas é muito diferente de entender das marcas e dos bebedores de cerveja.
Há alguns anos, uma fabricante de bicicletas teve um grande prejuízo com a queda de vendas, “roubada” pela chegada dos MP3s. A fabricante de bicicletas enxergava como grande concorrente as outras fábricas de produtos similares, não levando em consideração a concorrência indireta dos MP3s. Tanto as bicicletas como os MP3s tinham preços parecidos. Porém, os MP3s representavam uma grande novidade, uma experiência nova; ter um MP3 significava estar up to date. E foram vendidos muito mais MP3s do que bicicletas. Nesse caso, o grande problema não foi a chegada do MP3, mas a falta de perspectiva da fábrica de bicicletas, que tinha uma visão míope e não enxergava a novidade sob um outro ponto de vista, como uma ameaça, ou melhor, como uma oportunidade para o seu negócio.
Por isso, é importante sempre sair do lugar comum, pesquisar, observar, mudar os pontos de vista, se colocar no lugar do outro, pensar sob as vertentes do consumidor, da ideia criativa e da necessidade comercial do cliente, para planejar e desenvolver uma comunicação mercadológica de qualidade e eficaz.
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Do blog da AscentBRAND
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